quinta-feira, 16 de julho de 2020

Ao meu primeiro amor do Tinder: uma carta

Querido Vinícius,
vou dizer isso de novo porque é um fato verídico: acho que eu nunca chamei você de "querido" e derivados e se chamei, tenho certeza quase absoluta que foi em uma entonação irônica.
Faz tempo que não falo com você. Acho que você excluiu meu número do seu celular, ou me bloqueou no WhatsApp, mesmo que eu não lembre de nenhum motivo explícito para que isso acontecesse, mas o fato de que agora você tem namorada deve ser uma boa justificativa.
Não sei se você esperava que eu fosse escrever isso para você, mas saiba que eu acho injusto não incluir você nos meus destinatários.
Nossa história é longa e não sei se conseguirei resumi-la em poucas palavras, mas vamos lá.
Lembro de ter conhecido você em um dos momentos mais conturbados da minha vida: meu último ano do ensino médio, mas essa nem é a pior parte: nos conhecemos no Tinder.
Rolou todo o processo típico de alguém que usa Tinder: demos match, rolou aquele breve momento de silêncio para ver quem tomava coragem de mandar mensagem primeiro e você acabou me chamando para perguntar algo relacionado a coxinha.
Foi uma coisa bem aleatória, né? E pensar que depois você mesmo admitiu que só mandou aquilo porque queria conversar comigo.
Você sempre me chamava para conversar e eu achava estranho porque você era (e talvez continue sendo) mais envergonhado do que eu.
Mas, no final das contas, eu gostava de conversar com você.
Gostava de trocar piadas, emojis e tentativas frustradas do que deveriam ser flertes até o momento em que resolvemos nos encontrar.
Acho que a parte mais engraçada de toda a nossa história foi quando você perguntou se eu tinha ido em um evento do IF da sua cidade porque você tinha visto uma garota muito parecida comigo lá e, se eu não me engano, foi assim que descobrimos que não morávamos na mesma cidade; no final, marcamos de nos encontrar na capital na estação de trem.
Eu cheguei primeiro e você chegou um tempinho depois. Mais tarde, eu percebi que você sempre se atrasava (pelo menos, sempre que nós marcávamos de nos encontrar).
Andamos pelo centro de Porto Alegre enquanto conversávamos. Resolvemos que iríamos ver um filme, mas quando chegamos no cinema vimos ele de portas fechadas.
Tínhamos esquecido um pequeno detalhe: era feriado.
No final, entramos em consenso que pegaríamos o trem até Esteio e iríamos à Expointer.
Conversamos enquanto estávamos no trem, tomei seu sorvete (e você me explicou que estudava para aprender a produzir a colher do sorvete e demais objetos cujo material seria de plástico), tiramos uma foto para mandar para a sua mãe e depois de uns vinte minutos, chegamos ao nosso destino.
A última vez que eu tinha ido à Expointer eu era bem pequena, então não lembrava de muita coisa de lá, só daquelas três bolas grandes que é basicamente o símbolo do evento.
Perambulamos para cima e para baixo até resolvermos ir na roda-gigante. Infelizmente, fomos pelo pior caminho e acabei embarrando meus tênis.
Enquanto estávamos na fila da roda-gigante, eu finalmente tomei vergonha na cara para te abraçar.
E porra, aquela foi a primeira vez que eu abracei alguém daquele jeito.
A fila era enorme e nós ficamos abraçados por um tempo. Se eu dissesse que não gostei, estaria mentindo.
Quando chegou a nossa vez, eu pensei: “se a gente não se beijar, eu vou ter um troço”.
Ficar abraçada com você na roda-gigante enquanto ela subia me deixava ainda mais nervosa. Eu não te disse aquilo, mas eu tenho medo de altura e por mais que a vista fosse linda, a minha mente estava uma zona de guerra.
Foi só eu olhar para os seus lábios que aquilo acontecesse.
Sinceramente, eu nunca tinha ficado com ninguém e aquele era meu primeiro beijo.
Eu nem sabia o que estava fazendo, muito menos o que deveria fazer, só sei que meu dente bateu no seu e eu morri de vergonha, sem contar que eu estava com medo do meu aparelho cortar seus lábios ou coisa do tipo, mas, no final das contas, eu não te machuquei… Quer dizer, eu acho que não.
Depois daquele beijo horrível na roda-gigante, eu pensei seriamente que você ia olhar no fundo dos meus olhos e dizer: “mano, não vai dar certo, não”, mas nós andamos pelo Expointer inteira de mãos dadas enquanto eu usava o seu moletom.
No final da tarde, voltamos à estação: eu ia para um lado e você ia para o outro.
Pensei que teríamos mais um momento juntos, mas assim que chegamos lá, meu trem chegou. Nós demos um selinho e eu entrei no vagão.
Um tempinho depois, olhei para o meu corpo e percebi que ainda estava com seu moletom e, naquele momento, eu fiquei feliz: eu tinha uma desculpa para nos encontrarmos de novo.
Acabamos nos encontrando mais umas cinco, seis vezes, sendo só três deles o que poderia ser considerado um “encontro”. Sinceramente, não gosto de definir aquilo como encontro, eu prefiro usufruir do termo “rolê” porque tem um peso mais leve se comparado à palavra anteriormente citada.
Lembro de ter a impressão de que você gostava mais de mim do que eu gostava de você e minhas impressões foram negadas quando você mandou aquelas mensagens.
E mais uma vez, eu concluí que me iludi em relação aos sentimentos que não me pertencem.
Por mais que eu acreditasse nisso, às vezes eu repenso meus próprios sentimentos da época.
Naquela época, eu me importava mais com o que você estava sentindo em relação a mim do que eu estava sentindo em relação a você e isso me preocupava tanto que eu praticamente me proibia de tentar desenvolver algo mais.
Às vezes eu tenho a impressão de que, na verdade, você não gostava de mim mais do que eu gostava de você, mas, sim, que eu tinha medo de gostar mais de você do que você gostava de mim.
O pior foi ter conversado com inúmeras pessoas que defendiam a mesma teoria: “sempre tem um que ama mais do que o outro” sendo que, parando para pensar agora, eu concluo que cada um ama do seu jeito.
E talvez tenha sido isso que não tenha sustentado nós dois, afinal, um relacionamento deve contribuir de ambos os lados, mas o que eu quero dizer é: eu acho que não contribuí.
No final das contas, há um ano atrás, eu concluí que eu não tinha te amado, mas agora chego em uma nova conclusão: sim, Vinicius, eu te amei. Não como "deveria", mas como me permiti amar.
Com amor, Katherine.

5 comentários:

  1. oi, Kathhi! como vai?
    eu li e reli sua carta, e ela é muito bonita. gosto de como você escreve, dá vida a cada momento e examina seus pensamentos e observações. e sua conclusão ressoou comigo. acho que cada um ama do seu jeito também, é muito difícil comparar em uma escala de "mais" e "menos" quando é muito mais complexo que isso. relacionamentos são bem complexos. enfim, gosto de ler as cartas que você publica e o jeito você coloca seu coração nelas. espero que tudo esteja bem contigo, abraços ♥

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    1. Oi, Mari. Estou bem e tu?
      Fico feliz que tenha gostado da carta. Cheguei a essa conclusão de que cada um ama do seu jeito com a minha psicóloga quando falamos sobre isso. Acho que é bem comum a gente tentar medir aquilo que não se mede, principalmente sentimentos.
      Fique bem, Mari.
      Beijos e até mais!

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  2. Aqui de boas observando como as suas mensagens sempre falam do quanto você não ama as pessoas o suficiente. Minha jovem, liberta seu coração e fique leve - ninguém nunca ama a gente o quanto que a gente gostaria, porque o que a gente deseja está na nossa cabeça e não no mundo real. E é pura canalhisse alguém esperar que você lhes ame mais do que você pode ou dá conta.
    Mas enfim, foi gostoso de ler, e de imaginar a cenas (embora zero conhecimento espacial, porque nunca estive em PA), e achei fofo que seu primeiro beijo tenha sido digno de filme da Netflix numa roda gigante ♥ é pra poucos, Kathhi!
    Beijinhos pra você :*

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    1. E lá vem a Shana cumprir seu papel de segundo psicóloga da minha vida (não leia isso em um tom zangado, é mais em um tom divertido).
      Sinceramente, vou ser sincera com você: eu tenho essa mania de querer "padronizar" momentos, jeitos e sentimentos. Eu achava que meu segundo amor tinha que "seguir o mesmo modelo" que o meu primeiro amor, sendo que, mesmo que envolva o mesmo sentimento, envolvem pessoas, situações e momentos diferentes. Vivo falando sobre essa minha mania de padronização com a minha psicóloga e agora estou tentando me policiar em relação a isso, mas é complicar deixar de lado maus hábitos que você adquiriu há tanto tempo atrás.
      Ah, e sinta-se convidada para vir aqui conhecer Porto Alegre, andar de trem, ir à Expointer e aos demais locais do RS, viu?
      E, sinceramente, esse beijo na roda gigante é um dos poucos clichês que aconteceu comigo que eu gosto.
      Fique bem, Shana.
      Beijos e até mais!

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  3. Acho que amar, na forma que livros, tv, sociedde impõe é tão pesado e nada próximo da realidade. Aprendi muita coisa e quebrei várias barreiras lendo sobre a idéia do amor burguês/romântico. Talvez porque eu seja mais velha que você, já que quando eu tinha sua idade também achava que o amor não era pra mim e que eu fazia tudo errado.
    E mesmo assim, eu amo clichês!!! Primeiro beijo na roda gigante? AJUDA AQUI, ME ABANA! Direto dos livros do John Green, menine!!! Adorei.
    Pode ter certeza que passarei por aqui mais vezes ;D
    Beijão, Kathhi!
    A Bela, não a Fera

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